Numa das cerimónias mais polémicas dos últimos anos, Rodri recebeu a Bola de Ouro e as opiniões dividem-se: há quem celebre “a vitória do futebol” e quem considere a atribuição ao espanhol “politiquices”. Pelo meio, a France Football já reagiu.

Culpados: Bellingham e Carvajal

Vincent Garcia, editor-chefe da conceituada publicação, reagiu à contestação de fãs e do próprio Real Madrid, que, em virtude da anunciada derrota de Vinícius Jr., cancelou a viagem da comitiva a Paris. Para o jornalista francês, a vitória de Rodri explica-se de uma forma bastante simples: a estupenda época realizada pelos espanhóis. Confuso?

“Vinícius sofreu com a presença de Bellingham e Carvajal no top-5; matematicamente, isso tirou-lhe alguns pontos. Isto também reflete a temporada do Real Madrid, que teve três ou quatro jogadores [entre os candidatos], com os jurados a dividir os seus votos entre eles – o que, no fim das contas, beneficiou Rodri“, afirmou Garcia.

Indignado com a informação prévia de que o brasileiro não venceria a Bola de Ouro, o clube não esteve presente na gala – onde, de resto, venceu a categoria de Melhor Equipa Masculina do ano. Carlo Ancelotti, o técnico merengue, também foi distinguido com o prémio de Melhor Treinador. Já a veia goleadora de Kylian Mbappé foi recompensada com o Troféu Gerd Müller.

O responsável pela organização do prémio mostrou-se desiludido com a atitude do clube. “Sofri muita pressão do Real Madrid [para revelar o vencedor], mas, como acontece com outros clubes, fui sempre claro, justo e talvez o meu silêncio os tenha levado ao limite. Mas foi igual com os outros. Fiquei desagradavelmente surpreendido com a sua ausência“, explicou.

“Fomos muito claros com eles e com todos os outros: este ano, os vencedores não seriam previamente avisados. Aceitaram todos, mas, à última da hora, não sei porquê, quiseram mudar a regra”, sentenciou o francês.

Rodri: “Uma vitória do futebol espanhol”

Em Espanha, diz-se que o discurso de Rodri no palco do Théâtre du Châtelet é já história e património do futebol espanhol. O jogador fez referência aos compatriotas que, antes dele, não venceram o prémio, recordou as dificuldades do início da carreira e elogiou Carvajal e Yamine Lamal.

“Boa noite a todos. Hoje tenho muitas coisas a agradecer. Quero agradecer em primeiro lugar à France Football, à UEFA e a todos os que votaram em mim. É um dia especial não apenas para mim, mas também para a minha família e para o meu país.

Quero agradecer à pessoa mais importante da minha vida, a minha namorada: comemoramos 8 anos juntos precisamente hoje. Sem ti, Laura, este caminho não seria o mesmo, muito obrigada”. 

Quero agradecer à minha família, por todos os valores que me passaram, por me terem ajudado desde o início a dar os passos certos, por me criarem para ser um homem que joga futebol por amor.

Quero agradecer também ao meu agente, Pablo: quem diria que aqui chegaríamos, quando me ias levar e buscar aos jogos, sempre com um carinho incondicional, como nunca em outro vi?

O futebol é um desporto coletivo. Obrigado ao City, ao staff e aos jogadores. Sem vocês não teria conseguido. Obrigado à Seleção, ao Luís de la Fuente, por há tanto tempo confiar em mim.

Quero mencionar também os meus companheiros, com quem venci o Europeu. Um em especial, Carvajal, que teve uma lesão igual à minha, e que merecia estar aqui a receber este prémio. Outro que o vai ganhar muito em breve és tu, Lamine [Yamal]. Continua a trabalhar, como te disse na final. Tens um futuro brilhante pela frente.

Esta é uma vitória do futebol espanhol. Uma recompensa, depois de tantos que não venceram o prémio e o mereciam, como Xavi, como Iniesta, como Iker [Casillas], como Busi [Busquets]. Não quero esquecer-me de ninguém. Esta é também uma vitória dos médios centro.

Estou por fim a dar visibilidade aos médios, cujo trabalho, tão importante, é por vezes ofuscado. Por fim, gostaria de contar uma história que ilustra o processo que me trouxe até aqui. Com 17 anos, fiz as malas para cumprir um sonho: ir para o Villareal e jogar na primeira divisão.

E lembro-me que um dia liguei ao meu pai, a chorar, com a sensação de que tinha investido tudo e que o sonho estava a acabar. E ele disse-me: “Chegámos até aqui, não vamos agora atirar a toalha ao chão“. E esse dia mudou a minha mentalidade.

Um rapaz normal, com valores, que estudou e estuda, que tenta fazer o certo e que não corresponde aos estereótipos associados ao futebol pode chegar alto. Obrigado a todos”.

Vinícius Jr.: “Eles não estão preparados”

Vinícius Jr. publicou uma mensagem curta nas suas redes sociais logo após o fim da cerimónia. O brasileiro prometeu continuar a lutar pelo reconhecimento, garantindo que se esforçará “10 vezes mais” se preciso for. E deixa o aviso: “eles” não estão preparados para o que aí vem.

Também Ancelotti agradeceu a sua distinção através de uma publicação, e fê-lo com dedicatória especial. “Quero agradecer à minha Família, ao meu Presidente, ao meu Clube, aos meus Jogadores, e sobretudo a Vini e a Carvajal“, escreveu.

Eduardo Camavinga também deixou uma mensagem de apoio ao colega, tal como Fede Valverde.

Politiquices do futebol. Meu irmão, és o melhor do mundo e nenhum prémio vai dizer o contrário. Adoro-te”, escreveu o médio francês. Já o uruguaio disse: “Não há prémio capaz de reconhecer o quão bom és. E não falo apenas da tua qualidade como jogador – e sim, sobretudo, da que tens fora de campo. Amo-te, irmão”.

Richarlison e Lucas Paquetá também uniram a sua voz ao coro de apoio que o brasileiro recebeu.

“Infelizmente, por critérios que ninguém consegue entender, o prémio não veio. E que não me entendam mal, Rodri é um baita jogador, que merece estar entre os melhores. Mas o Vini não levar essa Bola de Ouro foi constrangedor. […] Você é gigante e o melhor do mundo, moleque! E troféu nenhum vai mudar isso. Siga em frente e nunca se cale! Tamo junto!”, escreveu o avançado do Tottenham.

Já o médio do West Ham foi peremptório: “Só pra você saber que eu tenho orgulho de dizer que sou seu amigo, que te admiro e torço por você mais do que por qualquer vitória minha“, garantiu.

Lamine Yamal: “Uma grande honra”

O jovem de 17 anos Lamine Yamal foi distinguido com o Troféu Kopa, entregue ao melhor jogador com menos de 21 anos a 31 de Julho de 2024.

No seu discurso de aceitação, fez uma referência ao bairro onde cresceu – e ao qual a extrema-direita espanhola já se referiu como “monturo”, o lugar onde se deposita ou acumula esterco.

“É uma grande honra para mim. Dedico o prémio à minha mãe, à minha avó, à minha família, a toda a seleção e ao meu clube”, terminando com um ferveroso “visca el Barça e capital 304“, aludindo ao código postal de Rocafonda, um dos mais pobres bairros catalães.