Sai Rúben Amorim, entra João Pereira: o cenário, que há uma semana pareceria impossível, está prestes a concretizar-se. Apesar de inesperado, era há muito preparado.
Tudo se vai…
A saída de Rúben Amorim provocou um tumulto, de dimensões quase catastróficas, no seio do Sporting, amargurando o discurso de uma larga franja de adeptos leoninos. A mudança assusta, o passado pré-Amorim assombra. Em época de Halloween, quase parece um susto, brincadeira de mau gosto.
Entende-se: vindo de Braga, o técnico chegou a Alvalade, que então se erguia como um cemitério de treinadores, fantasmas que populavam angústia, exibições desvairadas e resultados comprometedores, e tornou-se o rosto mais visível do mérito de um Sporting que é, hoje, respeitado como nunca – dentro e fora de campo.
Rúben Amorim tomou a decisão correta?
Rúben Amorim tomou a decisão correta?
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Para muitos o melhor treinador da história do Sporting, Rúben Amorim não teve um percurso perfeito nos leões, mas quase. O decepcionante quarto lugar no pós-titulo de 2021 e as acumuladas goleadas europeias (curiosamente, duas delas frente a Ten Hag, a quem agora sucede), perdem-se na imensidão de alegria provocada pelos títulos vencidos.
O futebol jogado e a capacidade de reinventar um plantel que, ao longo do tempo, foi perdendo peças vistas como indispensáveis sem nunca deixar de vencer, colocaram Amorim e a estrutura leonina num patamar superior.
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Pelo Sporting, a nível nacional, o treinador apenas não venceu a Taça de Portugal, devolvendo ao clube leonino uma já distante ambição desmedida: foram, no total, duas Ligas Portugal, três Taças da Liga e uma Supertaça Cândido de Oliveira.
Mas, mais do que os troféus que embelezam museus e levam à rua, em euforia, milhares e milhares de adeptos, como herança fica, sobretudo, a imagem restaurada de um clube hoje com capacidade para atrair jogadores de topo. E que entra como favorito, não pelo nome e passado, mas por argumentos inegavelmente superiores, em qualquer partida que dispute.
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As informações públicas parecem indicar que o último jogo de Amorim será na Pedreira, coincidência poética e irónica, que encerra um simbolismo inesperado: o da mágoa comum. Não era este o adeus, precoce, com toques de abandono, que o universo leonino antecipava como inevitável.
Depois do micdrop no Marquês, o Sporting esperava despedir-se de Amorim com a cereja no topo de uma história digna de contos de fada – um bicampeonato que escapa desde 1953/1954. O destino, ou a vontade do trenador português, assim não quis.
… e aquilo que fica
João Pereira não é, entre os adeptos leoninos, um nome consensual, esperado, sonoro. Mas é, há muito tempo – talvez desde a noite em que pendurou as chuteiras, e, de Rúben Amorim, recebeu um apertado abraço junto à linha que tantas vezes em Alvalade percorreu – o nome escolhido por Frederico Varandas para suceder ao técnico agora a caminho de Manchester.
Um salto de fé do presidente do Sporting, que vê no ex-lateral o mesmo je ne sais quoi que, há quatro anos, o levou a apostar em Rúben Amorim, convictamente, mesmo debaixo de um coro de incertezas e críticas.
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O investimento é, agora, diferente, não pesou aos cofres leoninos; mas o percurso do ainda treinador da equipa B do Sporting foi sempre encaminhado para que pudesse crescer, assimilar ideias, aprofundar capacidades. É, na verdade, um protótipo: o primeiro produto de uma Academia que quer formar, também, treinadores de topo.
A intenção não terá sido moldar João Pereira à semelhança e imagem de Rúben Amorim, mas reproduzir a fórmula que, com tanto sucesso, aproximou o Sporting de palcos há muito distantes.
O contacto próximo com a juventude que brota em Alcochete, a comunicação aberta, irreverente e confiante, o ainda próximo e recente passado de balneário, a leitura competente do jogo – são características que o próximo treinador do Sporting foi revelando de forma instintiva, quase natural, polida com a proximidade aos preâmbulos da equipa principal.
Num contexto assim, o maior desafio de quem chega, mais do que fazer jogar, está em manter uno e motivado um balneário traído, após um arranque de época indomável.
O perfil aguerrido de João Pereira, que toda a carreira se fez amado pelos seus e odiado pelos adversários, antecipa pulso forte e capacidade para motivar – por despeito, raiva, mas também compromisso – um grupo à procura, mais do que nunca, de se mostrar o principal candidato ao bicampeonato. Apesar de todos os pesares.
Quando se despediu dos relvados, João Pereira disse que o seu único arrependimento, a grande tristeza do fim, passava por não ter dado “mais títulos” ao Sporting. Pode fazê-lo agora, capaz seja de suportar a pressão, dar continuidade às ideias e cavar tempo para implementar aquelas que consigo traga.